Seis anos de aplicação de membros biónicos no Hospital Veterinário de São Bento

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Há cerca de seis anos, uma cadela de porte pequeno com cerca de 11 anos deu entrada no Hospital Veterinário de São Bento para, o que se julgava ser, uma consulta de rotina. De nome Sultana, a cadelinha sénior com um ar simpático apresentava, contudo, sintomas na pata dianteira esquerda, que , de imediato, fizeram ponderar a existência de alguma patologia.

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Na foto, a Sol, a pequena cadela que beneficiou desta intervenção no passado mês de abril

Após uma primeira suspeita, veio, através de exames, a confirmação de que a Sultana era portadora de um carcinoma e o tratamento passaria pela amputação da pata. Desde o primeiro momento, a preocupação do Hospital centrou-se no tentar encontrar uma solução para o tratamento da Sultana, que lhe permitisse a melhor qualidade de vida.

Tendo conhecimento de um tipo de cirurgia inovadora que consistia num implante de uma prótese endo-exo, pensámos: E porque não, permitir que a Sultana tenha acesso a um tratamento pioneiro, e nesse contexto, introduzir em Portugal esta técnica inovadora?

De facto, a endo-exo prótese consiste num dispositivo de metal que é implantado no osso e é composto por diversos módulos que, grosso modo, se dividem em uma parte interior (endo) e uma outra exterior (exo) aplicados na pata do animal.

Através de um planeamento concertado, com uma equipa multidisciplinar, projetámos então a implantação de uma endo-exo-prótese no membro amputado de Sultana. A hipótese foi bem acolhida pela dona da cadela e criámos os meios necessários para a cirurgia.

Sabemos ter sido esta, de facto, a primeira cirurgia do género em Portugal e também a primeira prótese com este tipo de técnica na Península Ibérica.

Dada a sua complexidade e após um exigido período de repouso para que o endo-implante se integrasse no osso da Sultana, esta foi submetida a uma reabilitação com esquemas de fisioterapia baseados em hidroterapia. A Sultana foi-se então adaptando gradualmente ao seu novo membro artificial e, após 5 meses, estava totalmente adaptada.

Depois de Sultana, e ao longo dos últimos 6 anos, seguiram-se mais 7 animais: 6 cães e um gato. Todos casos clínicos desafiantes. O último dos quais foi realizado entre abril e maio deste ano e que trouxe, igualmente, mais desafios: tratava-se da aplicação de uma endo-exo prótese numa cadela com pouco mais de 3 quilos, feito que, segundo sabemos, será uma das primeiras aplicações feitas no mundo num animal de tão baixo peso.

Foi gratificante para toda a equipa envolvida confirmar o sucesso de todas estas intervenções e, acima de tudo, confirmar como estas novas próteses contribuem para a mobilidade, autonomia e reabilitação dos animais.

Este tipo de prótese permite que os animais se desloquem de forma natural, mimetizando a realidade, uma vez que o dispositivo de metal (titânio) ao ser colocado diretamente no centro do osso do membro amputado, oferece ao animal uma maior noção do posicionamento da prótese, possibilitando-lhe uma movimentação mais natural .

À semelhança do que acontece na medicina humana, as próteses em animais têm tido uma rápida evolução. Para isso a inovação e a tecnologia têm dado um contributo fulcral, ao permitir transcender da, já comum, substituição integral da articulação coxo-femoral, para outras articulações.

Estudos pioneiros tiveram como objectivo encontrar uma solução para a inadaptação às exo-próteses em animais com necessidades específicas de substituição integral de um membro. Foi então que surgiu a implantação das exo-próteses no organismo, integrando a componente “endo” na fórmula. Os resultados revelam a vantagem objectiva deste tipo de próteses na adaptação e receptividade do animal ao elemento artificial (exo-prótese) como parte integrante do organismo.

Todos estes casos são o culminar de um árduo e dedicado trabalho de equipa, cujo sucesso em muito se deve à dedicação dos colaboradores do Hospital Veterinário de S. Bento e para o qual o empenho pessoal me deixa naturalmente feliz.

 

Henrique Armés

Médico Veterinário do Hospital de São Bento

Doutorado pela Universidade autónoma de Barcelona

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